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UMA CARTA PARA VOCÊ – 2020 / AJEB-AM (Antologia organizada por Kátia Colares Ribeiro)

Cartas que os autores escreveram para suas mães
Cartas que os autores escreveram para suas mães

 

LIVROS & ESCRITORES

 

Alzerina Pinho

 

Para Terezinha Pinho Vanderley, in memorian

 

Diante do mar, que eu só vejo de vez em quando, me vem a certeza da grandeza que me aproxima sempre mais da pequenez humana. A pequenez do finito, do desígnio de ser caminhada rumo ao sim da inevitável partida. A finitude do Ser que segue em uma avalanche de sentimentos diários, conclamado a um avanço, sem trégua, rumo ao concluir missionário da existência.

Missão que acolhemos sem sequer nos dar conta e, de súbito, vemos passar a limpo uma vida inteira, na alucinante dor de ver suprimido o riso de alguém que amamos e desesperadamente perdemos. Talvez o derradeiro passo seja dado muito antes do suspiro final; muito antes da agonia de repassar uma existência inteira em segundos, tentando entender porque os reflexos não respondem, porque o tempo parece escoar, vida a vida, no ar que teima em ausentar-se, na paralisia dos gestos que antes foram de cuidado e cura.

Perdoa-me! Do último suspiro só entendo da dor dilacerante de ser insignificante nesse portal que separa o corpo do espírito; só entendo da agonia de não fazer parar o tempo e de não poder soprar esperança e colher sorriso, de não acolher o olhar de alívio de ainda ter vida.

Mas meu coração também precisa te dizer que, da vida de quem amamos, a partida que nos tira a alegria também nos enche de saudade célebre, eternizada nas lembranças do aconchego que amparou os primeiros sonhos, e protegeu, e cuidou, e amou, até em dias que o amor fez duvidar-se e a generosidade precisou fazer-se maior que a pior decepção, e a caridade mais forte que a dor.

Sim... Há quem ama sem medida, há quem ama com gratuidade quase divina e, quando nos alcança, nos faz existir. (Gratidão eterna, minha mãezinha!)

Partir, então, é plantar na alma uma agonia que o tempo não suplanta. É cobrir nosso caminho com uma dor que abarca todo o peito e fica ali, circulando, procurando um lenitivo que acena e se esconde entre um arfar e outro, entre um respirar e um calar.

O derradeiro passo ajusta o compasso, aguarda... O suspiro último alcança o seu destino e para. Já não há o descompasso entre os espaços, o Criador fez o chamado.

Vai! E segue, em paz, para o outro lado do Caminho! Serás sempre luz a me conduzir, em memória, não importa a idade. No coração que fica sempre haverá gratidão, dor e saudade.

Com infinito amor, tua sempre filha.

Alzerina

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Amanda Peixoto Maia

  

Imperfeitas

 

Mãe, eu certamente não sou uma filha perfeita. Não sei cozinhar, então não preparo o almoço em seu lugar, mesmo você dizendo o quanto gostaria que o fizesse. Sou preguiçosa, então muita coisa deixo para fazer depois, o que você não aprova. Irrito-me quando me critica e nem sempre sou paciente com você.

Porém, a senhora também não é perfeita. Você é exigente, até consigo mesma, não se permitindo descansar antes que os deveres estejam terminados. Você se irrita quando as coisas não acontecem do jeito que queria e nem sempre é paciente.

Somos duas pessoas imperfeitas, mas, afinal, quem no mundo, não é?

Você sempre se sacrificou por mim, desde coisas pequenas, como me deixar comer o último pedaço de chocolate; até coisas grandes, como o emprego que teve que abrir mão para me criar. Apesar de brigarmos e discutirmos às vezes, eu sei que você só quer o meu melhor e tudo o que faz é por amor. Quando eu penso em como criar os meus futuros filhos, busco na memória a forma como você me criou, que no passado eu posso não ter visto o valor, mas agora percebo a sabedoria e o amor em seus atos. Apesar das oportunidades da vida, ou a falta delas, sei que onde está agora foi fruto de muito esforço, foco e dedicação, algo que considero um exemplo e incentivo para dar o meu melhor e chegar aonde você sabe que sou capaz.

Posso não ser perfeita, mas saiba que todo dia eu o busco dar alívio, seja com alguma tarefa ou só lhe fazendo companhia. O que eu mais quero é ser alguém que você possa contar em todos os momentos. Quero ser uma filha da qual sinta orgulho e que lhe traga alegria, pois você é o meu exemplo de mulher, profissional e mãe.

Não sei se alguma vez a senhora se sentiu insegura de algo que fez ou disse, ou se já pensou que precisava mudar algo em si para ser uma mãe melhor, porém saiba que eu te amo do jeito que é, com todas as suas falhas e qualidades. Não há ninguém no mundo que pudesse ter sido uma mãe melhor para mim.

Te amo para sempre.

 

Amanda Peixoto Maia

 

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Ana Gizele Costa dos Santos Oliveira

 

Uma Carta para Você

 

Tão difícil escrever

Uma carta que pensava eu... O que dizer?

Para quem falar?

Então a vida me dá a resposta.

Em meio a tantos problemas e dilemas da vida...

Minha querida mãezinha, esta carta é para você.

É porque venho agradecer.

Hoje com meus 48, três filhos no lombo e tantas vitórias e tombos.

Só penso unicamente em você.

Quando olhava de longe suas lágrimas solitárias lá no fundo do quintal.

Pensava eu

Que sofrimento!

Não quero isso para a minha vida.

Mas a vida, cheia de surpresas nos leva a outros caminhos.

Às vezes, suaves, outras vezes repletos de espinhos,

Tu foste tão forte e valente, hoje eu sei

Bem tentastes me ajudar, mas as escolhas foram minhas

Um casamento que não deu certo.

Três filhos, três desafios.

Penso tanto em você, em dias difíceis.

O que você faria? O que não devo fazer?

Então mesmo que tenha outras possibilidades, vou ao fundo do quintal e choro como você.

Talvez para me sentir forte

E mais próxima de você

O tempo passou, mas, ainda,

Sinto muito a tua falta, o teu cheiro, teu colo, tua sabedoria.

Talvez eu não tivesse mesmo jeito de mãe e esposa

Talvez não tivesse nascido para casar

Tantas coisas previstas, e eu ignorei

Em terra de cego quem tem olho, realmente é rei

Mas eu, apaixonada pela vida não enxergo nada

Obrigada mãe querida.

 

Ana Gizele Costa

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Ana Guimarães


 Abro minha janela e é noite de lua cheia a iluminar o quarto, pensamentos surgem e nele encontro a paz quando começo a relembrar a infância, queria hoje toda a inspiração para relatar sobre pessoas que me deram todos os ensinamentos que hoje carrego com maestria...e minha mão se encarrega de deslizar ao pegar uma linda caneta dourada sobre um papel frases que tocam, então exprimo...

  

Mestre de opiniões fortes e sadias,

Exibia uma fortaleza nobre

Unica de um pai amoroso

 

Pelas lembranças saudosas,

As relembro com carinho e as emoções

Invadem meu ser, e a vontade era de te ouvir,

 

Lembrando dos teus conselhos para

Unir e dar laços harmonizados nos

Intervalos da noite e do dia

Zelando por todos nós...

 

E

 

Minha força externa e na força

Interna estimulas, és guerreira e

No meu caminho és luz, o império

Hoje, amanhã e no futuro sempre

A terei como exemplo a seguir.

 

Muitas foram as escolhas

A tomar e acertadas no caminho

Estarei sempre a trilhar.

 

Na busca eterna também de ser mãe

Abraço os teus ensinamentos que vão

Iluminando minha caminhada e

Realizando sonhos que a vida proporciona.

 

Obrigada pela chance de ter sido "a filha".... gratidão por tudo...

 

Ana Guimarães

 

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Dayse Peixoto Maia

 

Manaus, 31 de agosto de 2019

 

À Ignez, minha mãe, com amor, onde estiver...

 

Estou escrevendo na tentativa de suprir a falta que sinto de não ter me despedido de você. Se soubesse que ias partir, não teria viajado. Que saudade! Você foi embora e eu não estava aí para te dar um beijo, sentir teu cheiro, ouvir tua voz chamando por mim. O que me conforta é saber que foi melhor para você, só para você!

Muitas vezes fico a pensar o que estaríamos fazendo ou falando se estivesses aqui; ou cogito hipóteses sobre sua felicidade em relação aos que chegaram depois que partistes. Muitas coisas mudaram. Coisas muito boas têm acorrido comigo, tenho sido ricamente abençoada por Deus; penso que de suas filhas talvez eu seja a de vida mais tranquila atualmente. Não que não tenha lutas e decepções, mas sigo tentado fazer as escolhas mais adequadas, embora nem sempre consiga.

Penso muito em você especialmente no natal ou quando vejo os antúrios, mas às vezes em qualquer dia bate um vazio, uma vontade do teu colo, uma melancolia. Fico imaginando situações querendo abrandar a saudade e talvez o remorso que geralmente tolda meus olhos e coração. As lembranças traiçoeiras levam-me para aqueles momentos em que foi egoísta e não atendi ao que pedias ou precisavas. Quando se é jovem é tão mais fácil ignorar, depois de algumas décadas, é tão difícil esquecer detalhes que antes pareciam até não existir.

Lembro da última vez que nos falamos, lembro do telefone, do hotel em que estava; suas últimas palavras foram lindas! Uma bênção e uma declaração de amor por mim! Não as esquecerei nunca. O amor e a saudade são eternos.

Mesmo ausente continuas a me inspirar a ser forte, a ser Carvalho... E eu o serei até nos encontrarmos novamente...

Com amor,

 

Kika

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Núbia Litaiff Moriz Schwamborn

 

Carta à Minha Mãe...

 

Hoje, dia 17 de agosto de 2019, caso tu estivesses entre nós, completaria 87 anos. Para mim, não foi um dia normal, melancolia, tristeza e principalmente saudade, fizeram parte do meu cotidiano...  Lamentavelmente, não podemos voltar ao tempo, a vida é fugaz e segue o seu curso como um rio natural...

Quisera eu poder te abraçar novamente, olhar teu rosto e teus olhos tristes. Sim, nos últimos tempos, muitas vezes comentei que o brilho dos teus olhos já não era o mesmo. Exercendo o ofício da escrita, por mais que eu tente, não consigo conter as lágrimas. E, à medida que escrevo, as reminiscências e doces lembranças desfilam na minha mente.  Retomo agora uma imagem gravada no coração: a lembrança de minhas duas filhas, saindo contentes de casa, para tomarem café na casa da vovó. Infalivelmente nos sábados. E as festinhas familiares de Páscoa, Dia das Mães, Dia dos Pais, Dia das Crianças e Natal? Sem os doces e quitutes feitos por tuas mãozinhas, nada seria perfeito... Nunca ninguém fez uma torta de banana que se comparasse à sobremesa feita por ti. Muitas vezes comentamos, porém nunca descobrimos o segredo... Seria o acréscimo na receita, de uma porção de amor?

Por mais que façamos tentativas de reunir a família, e mesmo quando estamos juntos, há uma grande lacuna, a tua presença-ausência é muito forte e há, então, uma mistura de alegrias e tristezas...

Quanto a mim, com o tempo já não te via apenas como mãe, mas a conselheira e amiga prestativa. Cada dificuldade no trabalho vencida e tu dizias que sabias que eu conseguiria. Segui teus passos e mais do que nunca, tenho a certeza de que o exercício do Magistério foi feito para nós... 

Às vezes, faço algumas reflexões: talvez eu não tenha sido uma filha perfeita, quem sabe não deveria ter respeitado menos tuas vontades? Recordo-me que quando lhe convidamos para ir à Alemanha, tu disseste: “eu que não vou sair por aí, sem entender nem falar nada...” e vieram outras viagens, outros passeios e a senhora sempre dizendo “não” e nós ouvindo banais justificativas: “- Quem vai cuidar da casa? E o cachorro, e as galinhas?”.  E assim, respeitávamos tua decisão...

Enfim, o tempo passou e nos roubou o teu doce convívio. Contudo, tua lembrança, teus ensinamentos e os valores repassados permanecem conosco para sempre! Obrigada, mãe, por tudo que representas para nós. Saudades eternas!


Núbia Litaiff Moriz Schwamborn


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Silvio dos Santos Filho

 

Carta à minha mãe

 

Fortaleza-CE, 12 de outubro de 2019

 

Querida mãezinha...

 

Desculpa-me pelos atropelos da linguagem apressada, mas eu não poderia perder a oportunidade proporcionada por este porta-mensagem preso na perna desta jovem águia a caminho do firmamento, para te mandar notícias minhas, perguntar como vai essa vida de paraíso e pedir perdão por não ter sido capaz de impedir que tão cedo tu me deixasses.

Antecipando respostas às perguntas que deves ter guardado para mim, a saúde do corpo vai bem, a da alma também, mas amor equiparado àquele que tanto me dedicaste eu não encontrei em mais ninguém, o que desanimado me tem deixado.

Abdiquei da morada no cantinho da nossa terra natal onde me deste a luz e me ensinaste a dar os primeiros passos, no entanto retorno periodicamente para revê-lo e reviver as delícias de um passado modesto, mas inesquecível.

Como nos velhos tempos, ainda sigo o teu legado. Teus valorosos exemplos, no direcionamento da minha família, têm sido a tônica de toda a minha trilha. Mas ando cansado em decorrência dos anos contabilizados, ligeiramente debilitado e meio decepcionado com algumas das pessoas que se locomovem ao meu lado.

Nas noites em que me sinto mais desolado, recorro àquelas orações que me ensinaste, pacientemente, agradeço ao Criador por mais um dia de vida, rogo ao meu Anjo da Guarda para que me anestesie as feridas, proteja-me dos percalços da vida e olhe por ti onde quer que estejas.

Encerrado o diminuto ritual, esfrego as solas dos pés, uma na outra, para eliminar resíduos de poeira às vistas de quem me observa, porém, intimamente, faço-o para prevenir pesadelos ao longo da noite, conforme tu me ensinaste.

E assim vou vivendo, dos males me defendendo, e o que me parece correto, fazendo. De muitas coisas aprendi um pouco, ajudo a quem de mim precisa, mas nem sempre meu esforço é reconhecido.... Entretanto como se num jogo estivesse, conforto-me lembrando que um dia serei substituído.

Até a próxima oportunidade, mãe querida!

Reza por mim, nesta complicada vida.

 Silvio dos Santos Filho

 

 

BIBLIOTECA RAIMUNDO COLARES RIBEIRO

Transcritos da Antologia UMA CARTA PARA VOCÊ. Organizadora: Kátia Maria dos Santos Colares Ribeiro. Color Gráfica. Manaus (AM), 2020, páginas 13/15;1 6/17; 18/19; 53/54; 120/123; 138/139; 144;145; 165/166.

Seleção de textos: Kátia Colares Ribeiro

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
 
 

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Nossos sentimentos eternizados!

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